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Política de Distribuição de Lucros e Contabilidade: um pilar da governança societária

  • Foto do escritor: Larissa Nonato Silva
    Larissa Nonato Silva
  • 23 de ago.
  • 4 min de leitura

Quando falamos em governança de uma sociedade, dois pilares precisam estar claros desde o início:


  1. Como serão apurados e registrados os resultados (política de contabilidade);

  2. Como os lucros serão destinados (política de distribuição de lucros).


Esses dois temas se conectam diretamente à saúde financeira do negócio e ao alinhamento entre os sócios.


Na teoria, a destinação de lucros parece simples: cada sócio recebe na proporção de suas quotas de capital social. Essa é a regra geral do art. 1.007 do Código Civil.


Na prática, porém, a decisão sobre o que fazer com os lucros é muito mais complexa e estratégica.


A decisão sobre o destino dos lucros vai além de números no balanço. Ela impacta diretamente o ritmo de crescimento da empresa, o retorno financeiro dos sócios e a saúde da relação societária.


  • Reinvestir significa fortalecer o negócio, mas pode gerar frustração em sócios que estão na linha de frente, trabalhando intensamente, principalmente nos primeiros anos. Isso porque, quanto mais se retém no caixa da empresa, menor tende a ser a distribuição individual, o que pode causar desânimo ou sensação de desequilíbrio entre esforço e recompensa.


  • Distribuir em excesso gera satisfação imediata, porque coloca dinheiro no bolso dos sócios, mas compromete o chamado capital de giro, ou seja, os recursos que a empresa precisa manter disponíveis para pagar fornecedores, salários, contas do dia a dia e ainda suportar períodos de baixa receita. Uma distribuição precipitada pode deixar a sociedade sem fôlego para operar.


  • Ignorar a questão e não definir uma regra abre espaço para insegurança, imprevisibilidade e conflitos entre os sócios, já que cada um pode ter uma expectativa diferente sobre quando e quanto terá direito a receber.


É justamente para evitar esses problemas que se estabelece uma política formal de contabilidade e distribuição de lucros. Essa política funciona como uma regra de governança: ela define parâmetros claros para a utilização dos resultados, mas não precisa ser rígida. O próprio acordo de sócios pode prever exceções deliberadas em conjunto, como a possibilidade de flexibilizar a regra em situações específicas.

 

Exemplo prático:

Imagine uma empresa que define no acordo de sócios que 50% dos lucros serão sempre reinvestidos. Mas se em determinado semestre o resultado for muito acima do esperado, os sócios podem deliberar pela distribuição de parte desse valor extra, desde que respeitada a reserva mínima para o caixa. Assim, há clareza e segurança, sem perder flexibilidade.


Da regra legal à personalização contratual


O Código Civil estabelece, como regra geral, que os lucros devem ser distribuídos proporcionalmente às quotas de capital social de cada sócio.

Contudo, a legislação também permite que os sócios adaptem essa regra às necessidades do negócio, desde que façam isso de forma clara e formal:


  • No contrato social, deve constar expressamente a possibilidade de distribuição desproporcional dos lucros (ou seja, em percentuais diferentes da participação societária).


  • No acordo de sócios, podem ser definidos os detalhes da política de lucros, como percentuais, periodicidade de distribuição, regras de retenção e exceções.


Em outras palavras, a lei estabelece a regra geral, mas também admite exceções: os sócios têm a liberdade de organizar a distribuição de lucros de forma diversa, desde que isso esteja previsto no contrato social e detalhado no acordo de sócios. Assim, é possível adaptar a aplicação dessa regra à realidade da empresa, considerando seu estágio de desenvolvimento e os objetivos de crescimento definidos pelo grupo societário.

 

Estrutura de uma política de lucros bem desenhada


Uma política de distribuição e contabilidade que realmente funcione não se limita a dizer “X% será distribuído e Y% será reinvestido”.


Ela deve ser um conjunto de regras de governança financeira, capaz de equilibrar liquidez para os sócios, previsibilidade para a empresa e segurança jurídica para os sócios.


Entre os elementos que podem (e devem) ser incluídos estão:


  1. Apuração periódica dos resultados


Definição da frequência (mensal, trimestral, anual) e dos critérios para considerar lucro líquido disponível para distribuição.


  1. Reservas obrigatórias e finalidades específicas


Destinação prévia de parte dos lucros para fundos de capital de giro, pagamento de colaboradores estratégicos ou investimentos de expansão.


  1. Distribuição diferenciada entre sócios


Possibilidade de privilegiar sócios que estão efetivamente envolvidos na operação, prevendo que sócios investidores recebam apenas em ciclos maiores ou sobre o excedente.


  1. Regras de recomposição de reservas


Estabelecimento de métricas objetivas (ex.: manter em caixa o equivalente a 12 meses de custos fixos), evitando decisões baseadas apenas em percepção ou conveniência.


  1. Exceções deliberadas em conjunto


Previsão de que, em situações extraordinárias (ex.: resultado excepcional, venda de ativo relevante, aporte externo), os sócios possam, por deliberação formal, flexibilizar a regra principal.


  1. Governança e transparência


Critérios claros para contabilização, obrigação de prestação de contas periódicas e necessidade de quórum qualificado para alterar a política de lucros.


Por que isso importa?


A ausência de uma política clara sobre a destinação dos lucros é uma das principais fontes de conflitos societários. Muitas empresas conseguem superar questões burocráticas do dia a dia, mas acabam ruindo quando não há consenso sobre quando e como os sócios terão retorno financeiro.


Alguns dos problemas mais recorrentes são:


  • Expectativas desalinhadas entre os sócios: enquanto um quer reinvestir tudo para crescer, outro deseja liquidez imediata para remunerar seu esforço. A falta de alinhamento de expectativas transforma a discussão em um embate pessoal, e não em uma decisão de gestão.

  • Distribuições precipitadas que comprometem o caixa: quando os lucros são distribuídos sem avaliação da real necessidade de capital de giro, a empresa pode se ver sem recursos para honrar obrigações básicas, como folha de pagamento, fornecedores ou contratos já assumidos.

  • Insegurança e falta de previsibilidade: sem parâmetros a seguir, cada sócio cria sua própria expectativa sobre o retorno do investimento, aumentando a chance de frustração, desconforto e até litígios.


Portanto, definir uma política de contabilidade e de distribuição de lucros não é apenas uma formalidade. Trata-se de uma medida de governança que garante previsibilidade, reduz riscos jurídicos e cria um alinhamento estratégico entre os sócios, fortalecendo a sustentabilidade da empresa.

 

Conclusão


Definir uma política de contabilidade e distribuição de lucros não deve ser tratada como mera formalidade contratual, mas sim como um instrumento de governança capaz de alinhar expectativas, reduzir conflitos, proteger a saúde financeira da empresa e garantir previsibilidade no retorno dos investimentos. Quando bem estruturada, ela equilibra reinvestimento e liquidez, trazendo segurança jurídica e fortalecendo o crescimento sustentável da sociedade.


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